Entrevista - Organoclorados

- Grata surpresa conhecer a ORGANOCLORADOS, através da sua atual gravadora no Brasil. Como tem sido essa parceria?
Muito obrigado, fico feliz em saber da surpresa positiva, ainda mais por ser através da gravadora. Estamos engatinhando nessa parceria, tudo muito novo para nós que militamos no segmento independente e em boa medida também estamos surpresos com a evolução e as notícias que nos chegam. Tem sido bem positiva e temos expectativa de bons resultados.
- Acredito que ela preveja também, o lançamento de um novo álbum. Isso já foi conversado?
Já conversamos bem rapidamente, mas nada está formalizado, até porque acabamos de firmar a parceria para o álbum que saiu em março deste ano e estamos observando o desenrolar das ações. Em termos de áudio, o material para o novo álbum está praticamente pronto, mas temos o cuidado para não atropelar as atividades de promoção e divulgação do “Dreams and Falls”. De qualquer forma, sabemos que a perspectiva é positiva para o que vem num futuro próximo.
- Recebemos a versão física de “Dreams and Falls”, e o material ficou ótimo. Qual a importância das mídias físicas para os membros da banda?
Em primeiro lugar, a qualidade sonora porque a mídia física preserva o que realmente fizemos em estúdio, as nuances e detalhes que inserimos e que muitas vezes têm uma complexidade que esse formato permite ao ouvinte captar e sentir. Em segundo lugar, o componente estético do conjunto capa/encarte/rótulo que carrega ao mesmo tempo valor artístico visual e conteúdo técnico-informativo. Embora represente um esforço adicional e tenha um custo alto para nossa realidade (temos de correr atrás para cobrir o caixa que ficou negativo... risos), o sentimento da realização de algo de qualidade diferenciada alivia essas questões. Outro ponto valorizamos é a possibilidade de oferecer ao público um item de qualidade diferenciada, muitas vezes desperta curiosidade das gerações mais novas. Então, resumindo, as mídias físicas ainda são muito importantes para nós e sempre tentamos viabilizar sua produção na melhor qualidade possível de forma que seja justa e atrativa para o público.
- “Dreams and Falls” é um material direto, mas acredito que ele se enquadre mais dentro do Rock N’ Roll raiz. Vocês também entendem desta forma?
Interessante essa relação com o Rock N’ Roll raiz que talvez esteja bem evidente na música “Unreal Searches”, pelo menos sob a noção que nós aqui da banda temos do que é o Rock N’ Roll raiz, quando pensamos em Buddy Holly, Chuck Berry, Elvis Presley etc. Se for nesse caminho, acho que não reflete exatamente o que predomina ao longo do álbum. Porém, considerando algumas análises e comentários que nos associam ao Classic Rock, numa forma mais ampla é possível identificar o Rock N’ Roll raiz. Tem um lance que a gente gosta muito que é quando a bagagem musical do ouvinte interage com a experiência sensorial proporcionada pela música que fazemos, resultando nas mais diversas interpretações, opiniões e análises. Esse processo é riquíssimo e muito nos alegra quando ele acontece. Uma coisa é certa: no “Drems and Falls”, quanto mais você ouve, mais você vai percebendo uns toques aqui e ali, provenientes de várias influências e referências que os quatro músicos da banda possuem.
- A língua inglesa foi utilizada nas letras do álbum. Por qual razão escolheram por esta opção? Vocês não acham que isso será um problema para ser aceito no Brasil, já que os discos anteriores são todos no nosso idioma?
A vontade de trilhar esse caminho sempre esteve presente porque sentíamos que algumas músicas se adaptam bem ao inglês. Outra coisa também é que algumas vezes eu escrevo letras originalmente em inglês, sem passar pelo português, elas resultam em composições que a galera da banda curte e estimula a fazer mais. Percebemos que era a hora de expor melhor essa faceta da banda, explorando percepções que a língua inglesa permite.
Em nosso álbum de estreia, “Princípio Ativo”, lançado em 2001, já tínhamos ousado incluir uma música em inglês (For You, Girl) que é muito bem aceita nos shows até hoje, então não nos parecia algo assim tão estranho para o público. Acho que a razão primordial é que simplesmente tivemos vontade de experimentar, sem pensar no que as outras pessoas poderiam pensar ou julgar. Aliás, temos agido assim desde a fundação da banda, com o gosto do desafio e um instinto pioneiro.
Outros fatores concorreram para que fosse justamente agora em 2025. Uma resenha crítica surpreendentemente bem positiva foi publicada numa revista digital com sede em Los Angeles, EUA, sobre o álbum “Quântico” (2018). Desde então, blogs e rádios do exterior repercutiram músicas nossas e várias delas entraram em playlists internacionais, mesmo cantadas em português. Na reta final das gravações do álbum “Saudade da Razão” (2022), a ideia veio à tona com força, pois haviam canções compostas em inglês que estavam guardadas, eu tinha acabado de compor “Just for Today” e elaborei versões para várias músicas, sendo que algumas delas se adaptaram bem ao inglês.
O público que acompanha a Organoclorados tem conhecimento de nosso compromisso em criar e apresentar músicas e letras com conteúdo de qualidade, seja qual for a língua em que sejam cantadas. Temos convicção de que nossa discografia demonstra isso muito bem. O público também já percebeu que gostamos de apresentar novidades, experimentar, sair da mesmice. Penso que o público no Brasil tem maturidade e mente aberta para aceitar e entender a proposta. Aos que vierem a nos conhecer através de “Dreams and Falls”, temos certeza que será uma porta de percepção muito interessante e provocadora. Esperamos que as músicas cantadas em inglês alcancem novos ouvidos, corações e mentes, no Brasil e no exterior.
Se considerarmos os shows realizados neste ano, com várias músicas do álbum no repertório, há sinais de que a aceitação tem sido bem legal e estimulante.
- A produção do material ficou com a própria banda? Porque não optaram por contratar um produtor de fora?
Sim, foi tudo por nossa conta e nos desdobramos para dar conta das várias fases, na base do instinto, aprendizado e criatividade. Nas gravações e na edição no Estúdio Jimbo, contamos também com a boa vontade e a colaboração do Técnico de Gravação Lucas Costa, para trocar ideias e entender as potencialidades e limitações do processo. A opção ausência de um produtor externo foi principalmente por enxugamento dos custos porque tudo foi feito no limite do comprometimento financeiro do grupo.
- “Insecurity” foi a faixa que mais gostei no trabalho de vocês. O que vocês podem falar sobre ela?
Senta que lá vem história! (risos)... Nos idos de 1988-1989, André e Roger formaram uma banda em Alagoinhas-Bahia, chamada Dose Letal, juntamente com amigos de colégio, faculdade e vizinhança. O vocalista Edvando fazia a maioria das letras e por um tempo eu toquei bateria com eles (e guitarra na Organoclorados desde 1985). Nessa época, André, Roger e Edvando começaram a compor essa música na versão em português e chegamos até a ensaiar e tocar em público, mas os próprios autores não estavam satisfeitos e achavam que faltava alguma coisa nos arranjos e a letra parecia incompleta. Com o tempo, ela ficou guardada, meio esquecida, mas eu sempre gostei do refrão dela. Estou falando de quase 30 anos de gaveta!
Quando começamos a selecionar músicas para um novo álbum em português, eu sugeri retomá-la e André bateu firme, dizendo que só topava inserir se houvesse uma melhoria da estrutura dos arranjos e a letra fosse revisada. Eu tomei aquilo como um bom desafio, mas empaquei. Meses depois, o projeto do álbum em inglês começou a tomar forma e eu tive a curiosidade de adaptar aquela letra incompleta para o inglês. Como mágica, tudo fluiu naturalmente de uma vez só a letra toda em inglês e a estrutura harmônica deslanchou. Em questão de dias a música Insecurity estava pronta e começamos a ensaiá-la, aprimorando os arranjos instrumentais. É um caso de composição cuja finalização tanto da música quanto da letra só foi possível em inglês, o que foi uma experiência incrível.
- ”Horses on the Streets” é outro ponto alto com influências diversas. Como se deu o processo de composição desta faixa?
Acho que dentre todas do álbum foi a composição que teve o processo mais fácil e rápido. Eu fiz música e letra tudo de uma vez só, em poucos minutos, durante um ensaio. Lembro que comecei a tocar na guitarra e a letra foi saindo de imediato. O restante da banda pegou no ar o sentido e a proposta e foi tocando. Horses on the Streets é uma das canções originalmente escritas em inglês e foi uma das primeiras a serem lembradas por Joir (bateria) na fase de seleção e ensaios preparatórios. É um tipo de música muito espontânea, quase com vida própria, na qual simplesmente deixamos nos levar, e acho que isso determinou todo nosso trabalho em estúdio.
- Já a letra de “Lori”, foi a que mais me prendeu. Por causa dela, escutei essa faixa por diversas vezes pra pescar referências. Qual a importância que vocês enxergam em temas particulares inseridos em obras musicais atualmente?
Sim, a letra é impactante e tentamos ao máximo colocar os elementos dos arranjos de melodia, harmonia e ritmo a serviço do seu significado e da interpretação vocal. Há várias referências que podem ser encontradas, inclusive particulares de quem ouve, porque Roger e eu inserimos camadas de arranjos melódicos de teclados e guitarras que podem ser mais ou menos percebidos a depender de quem escuta, ou mesmo do equipamento utilizado para ouvir. Em CD então, nem se fala. A experiência se amplifica.
Quanto aos temas particulares inseridos nas canções, penso que sua maior importância reside no poder de identificação com situações reais vividas ou presenciadas pelas pessoas, criando conexão, diálogo, vínculo entre elas e a banda. Para nós da Organoclorados, posso afirmar seguramente que é muito emocionante saber que podemos tocar assim nas pessoas. Essa relação sempre foi e continua importante principalmente nos tempos atuais em que solidão, depressão, distanciamento social e tantos outros aspectos da saúde mental se destacam na sociedade do século XXI. A letra de Lori se situa nesse contexto e como todas as outras que cantamos, é sincera e autêntica, e você pode em algum momento enxergar ou enxergar-se em naquilo que é dito em seus versos.
- Parabéns pelo trabalho, esperamos vê-los em muito breve...
Obrigado! Em nome da Organoclorados quero parabenizar vocês por esse espaço e também agradecer pela oportunidade de mostrar ao público um pouco mais sobre nossa atividade, principalmente quando estamos completando 40 anos de rock autoral.
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Força sempre e até breve!
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